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Chapter 7 - Capítulo 7: Entre Clãs e Comuns

Leque em seda fina, Olhar altivo que separa, Sombra que se arrasta.

A rotina da Academia se instalou com uma rapidez surpreendente, um ritmo marcial que não dava espaço para hesitações. Manhãs dedicadas a exercícios físicos que levavam meu corpo infantil ao limite da exaustão, tardes preenchidas com aulas teóricas que bombardeavam minha mente com história, táticas e a complexa teia de regras sociais, e militares de Konoha. Era um ambiente brutalmente eficiente em seu propósito: transformar crianças maleáveis em engrenagens da máquina de guerra da vila.

Eu me esforçava para acompanhar, impulsionado por uma mistura de medo e pela determinação silenciosa que havia forjado. Nos treinos físicos, minha falta de força e resistência inatas tornava-se um obstáculo constante. Compensava com observação aguçada, tentando analisar os movimentos dos instrutores e dos colegas mais habilidosos, buscando eficiência onde me faltava poder bruto. Nas aulas teóricas, minha mente adulta absorvia as informações com avidez, mas também com um filtro crítico constante, comparando a história ensinada – a versão oficial de Konoha – com os fragmentos das narrativas que lembrava da minha vida passada.

Foi durante uma dessas aulas teóricas, talvez uma semana após o início, que a estrutura social implícita da Academia, e por extensão, da própria Konoha, começou a se revelar de forma mais explícita. O tema do dia era a história dos clãs fundadores e das principais famílias shinobi da vila.

Iroha-sensei estava diante do quadro negro, desenhando com giz os símbolos dos clãs mais proeminentes – Uchiha, Senju (mencionado com uma reverência quase histórica, como uma força do passado), Hyuuga, Sarutobi, Nara, Yamanaka, Akimichi. Ela falava sobre suas contribuições para a fundação e defesa de Konoha, suas habilidades únicas (Kekkei Genkai) e seus papéis tradicionais dentro da estrutura da vila.

Sua apresentação era factual, quase neutra. Mas a reação na sala de aula era qualquer coisa, menos neutra. Observei os rostos ao meu redor. O menino Hyuuga endireitou-se sutilmente quando o símbolo de seu clã foi desenhado, um brilho de orgulho contido em seus olhos pálidos. Kenji – cujo sobrenome eu ainda desconhecia – exalava autoconfiança, parecia ouvir com um ar de quem já sabia tudo aquilo, talvez até com um leve desdém pela simplificação necessária para nós, iniciantes.

Em contraste, Hana ouvia com atenção genuína, seus olhos arregalados de curiosidade, como se estivesse aprendendo sobre lendas distantes. E eu... eu ouvia com um sentimento crescente de desconforto. A forma como os clãs eram apresentados, como pilares fundamentais da força e identidade da vila, criava uma distinção clara, mesmo que não dita, entre eles e os outros – os civis, os órfãos, aqueles sem linhagens famosas.

O verdadeiro impacto veio durante o intervalo, logo após a aula. As crianças se agruparam naturalmente, como sempre faziam, mas hoje a divisão parecia mais acentuada. Os filhos dos clãs mencionados – o Hyuuga, o Akimichi, alguns outros que eu começava a identificar – formaram um círculo à parte. Kenji estava com eles, rindo de algo que um menino Uchiha (reconheci o leque em suas costas) havia dito.

Hana e eu ficamos um pouco à margem. Hana estava tagarelando sobre como o Byakugan parecia incrível, mas sua voz tinha um tom ligeiramente admirado demais, quase subserviente.

Ao nosso redor, outros rostos também se mantinham à margem — um garoto de sobrancelhas grossas e determinação visível nos olhos, que nunca mencionava sua família; Mirei, sempre com um livro escondido no colo, ávida por aprender tudo o que pudesse, como se buscasse compensar algo que lhe faltava; e Daichi, que ria alto demais e fazia piadas em excesso, talvez para esconder o desconforto de não pertencer a nenhum brasão. Não falávamos disso entre nós, não havia conivência declarada, mas eu começava a perceber os olhares trocados, os pequenos gestos de encorajamento. Uma aliança muda estava se formando — não por proximidade, mas por exclusão. Éramos os sem-clã. E sabíamos disso.

Foi então que ouvi a conversa vinda do grupo dos clãs. Kenji falava em voz alta, claramente para ser ouvido.

"É óbvio que os clãs carregam o peso da defesa da vila," ele dizia, gesticulando com a mão. "Está no nosso sangue. Não é algo que qualquer um possa simplesmente aprender." Ele lançou um olhar rápido e desdenhoso em nossa direção.

Um menino Nara, que até então estava quase dormindo encostado na parede, bocejou. "Problemático... mas ele tem um ponto."

O menino Uchiha acrescentou, com um sorriso arrogante: "Alguns nascem para liderar, outros para seguir. É a ordem natural das coisas em Konoha."

Senti meu sangue gelar. Aquilo não era só orgulho de linhagem. Era preconceito cru, dito com naturalidade assustadora. A ideia de que o valor de alguém era determinado pelo nascimento, pela sorte de ter herdado um nome ou um poder específico, ia contra tudo que eu acreditava em minha vida anterior. Lá, pelo menos em teoria, lutávamos por meritocracia, pela ideia de que o esforço e o talento individuais deveriam definir o sucesso.

Aqui, parecia que o berço determinava o destino. E para alguém como eu, um renascido sem nome, sem clã, sem passado neste mundo, a implicação era clara: eu estava na base da pirâmide.

Hana pareceu murchar um pouco ao ouvir os comentários, seus ombros caindo ligeiramente. Eu hesitei, querendo dizer algo, mas as palavras ficaram presas. Apenas caminhei ao lado dela em silêncio.

Eu, por outro lado, senti uma raiva fria começar a borbulhar dentro de mim. Queria gritar, argumentar, apontar a falácia em suas palavras. Mas o que eu poderia dizer? Era uma criança em um corpo estranho, mal capaz de formar frases complexas na língua deles. Qualquer protesto seria inútil, talvez até perigoso.

Engoli a raiva, transformando-a em observação focada. Estudei Kenji, o Uchiha, o Nara. Vi a arrogância em seus olhos, a certeza inabalável de sua superioridade. Mas vi também, talvez, uma pitada de insegurança por trás da fachada? A necessidade de afirmar seu status tão veementemente não seria um sinal de dúvida?

Eles se apoiam em nomes e histórias passadas, pensei. Mas o que são, de fato? O que conseguem fazer sozinhos? A pergunta ficou pairando em minha mente. Talvez a linhagem desse vantagens – habilidades inatas, treinamento precoce, conexões. Mas não garantia caráter, inteligência ou verdadeira força.

Lembrei-me de histórias da minha vida passada, de pessoas que vieram do nada e alcançaram grandes feitos através de trabalho duro e genialidade. Lembrei-me de como sociedades baseadas em privilégios de nascimento muitas vezes estagnavam ou entravam em colapso.

Essa hierarquia social, essa divisão entre clãs e comuns, não era apenas injusta; era potencialmente uma fraqueza para a própria Konoha. Ao subestimar ou marginalizar aqueles sem nomes famosos, eles poderiam estar desperdiçando talentos preciosos, criando ressentimento e divisão interna.

O sinal tocou, chamando-nos de volta para a sala de aula. Enquanto caminhava, senti o olhar de Kenji sobre mim, um olhar que me media e me descartava como insignificante. Não retribuí o olhar. Em vez disso, concentrei-me no chão à minha frente, na promessa que havia feito a mim mesmo.

Eles podiam ter nomes, linhagens, orgulho. Mas eu tinha algo que eles não tinham: uma perspectiva externa, memórias de um mundo diferente e uma compreensão (ainda que fragmentada) do futuro que os aguardava. E tinha a determinação nascida do desespero de sobreviver.

Vou mostrar a eles, pensei, não com arrogância, mas com uma resolução fria. Vou mostrar que o valor não está apenas no sangue, mas no trabalho, na inteligência, na vontade.

A aula da tarde foi sobre controle básico de chakra. Iroha-sensei nos instruiu a tentar fazer uma folha grudar em nossa testa usando apenas chakra. Era um exercício de concentração e controle fino. Vi Kenji e o Uchiha conseguirem rapidamente, quase sem esforço, sorrindo com presunção. Hana lutava, a folha caindo repetidamente. O Hyuuga parecia meditar, a folha grudada firmemente.

Eu fechei os olhos, ignorando os outros. Lembrei-me da sensação do chakra da primeira vez, da analogia com eletricidade. Respirei fundo, visualizei a energia fluindo de meu centro, subindo pelo meu corpo, concentrando-se em um ponto na minha testa. Imaginei-a como uma cola sutil, pegajosa. Estendi a mão, peguei uma folha e a pressionei contra o local. Concentrei-me, mantendo a visualização, o fluxo constante.

Abri os olhos. A folha estava lá, grudada. Não foi fácil, exigiu toda a minha concentração, mas eu tinha conseguido. Não tão rápido quanto os prodígios dos clãs, mas tinha conseguido.

Vi Iroha-sensei me observar por um instante, um leve vinco de interesse em sua testa, antes de passar para o próximo aluno. E vi o olhar de Kenji, uma mistura de surpresa e irritação.

Um pequeno passo. Uma pequena vitória silenciosa. Mas naquele momento, pareceu imenso. A sombra no caminho, projetada pela arrogância dos clãs, ainda estava lá. Mas talvez, apenas talvez, eu pudesse encontrar uma maneira de contorná-la, ou até mesmo atravessá-la.

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