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Chapter 75 - Capítulo 75 – Vovó da Montanha Negra

Chen Shi soltou um suspiro de alívio, entrou na casa e perguntou:

"O bebê chorou?"

A parteira balançou a cabeça.

"Não."

O rosto de Chen Shi ficou sério.

"Bata no bumbum. Mais forte. Até chorar!"

A parteira levantou os dois recém-nascidos, um de cada vez, e deu alguns tapas. Após um momento, ambos começaram a chorar alto.

Chen Shi finalmente se sentiu aliviado.

Duas vidas — estavam salvas.

"Parabéns! Agora sua família ganhou dois bons meninos estudiosos. No mínimo, mandem-nos para a escola do vilarejo. No futuro, quem sabe até se tornem eruditos!"

Chen Shi sorriu para o marido de Cui’e.

O homem, sem entender o que estava acontecendo, apenas se alegrou com a dupla bênção e não fez perguntas.

Já era tarde, e Chen Shi não teria tempo de voltar para casa, então resolveu passar a noite na torre do sino da cidade de Luwei.

Ficar em uma estalagem ou na casa de alguém seria inconveniente para preparar e ferver suas poções durante a noite. A torre tinha janelas e portas em todos os lados, era confortável o bastante — e com o espírito guardião do vilarejo ali, era absolutamente segura.

Chen Shi preparou suas poções, alimentou Hei Guo (a Panela Negra), limpou o lugar e tirou a coberta de sua carroça para deitar-se no chão.

Durante os três dias do Festival da Lua, ele precisava aproveitar para ganhar o máximo possível.

Ainda era cedo para dormir. Hei Guo latiu duas vezes, confuso com as ações anteriores de seu dono.

Chen Shi, sem sono, sorriu e explicou:

"Meu avô dizia que, se o núcleo espiritual de um cultivador entra por engano em um útero, não se deve expulsá-lo. Se for expulso, o bebê nascerá morto. Isso porque o núcleo se torna a alma do bebê. Se o núcleo for removido, o bebê perde sua alma — e sem alma, morre. A criança é inocente. O erro é do cultivador; a mãe e o bebê não devem pagar por isso. Por isso, devemos estabilizar o cultivador e garantir que a mulher dê à luz o quanto antes."

Hei Guo fez um som baixo, ainda confuso.

Chen Shi balançou a cabeça.

"Não, é preciso enganá-los. Cultivadores têm o coração firme; se souberem o que aconteceu, matarão a mãe para escapar. Então é preciso enganá-los, para que não a matem."

Hei Guo pareceu entender. Era por isso que Chen Shi havia dito àqueles dois cultivadores do Reino Núcleo Espiritual para correrem em direção à luz — uma distração.

Mas o cão ainda não entendia totalmente.

E se o cultivador matasse a mulher — conseguiria escapar?

"Não."

Chen Shi balançou a cabeça.

"Se a mãe morre, o bebê também. Quando o núcleo entra no ventre, é o mesmo que reencarnar. Matar a mãe é cortar o próprio sopro vital. O laço entre mãe e filho é maior que qualquer poder espiritual. Nem mesmo o mais poderoso cultivador pode matar a própria mãe impunemente."

Ele continuou explicando calmamente:

"Primeiro, usei o talismã de acalmar o feto para acalmar as duas crianças agitadas. Depois, usei o talismã de parto para acelerar o nascimento. Se o bebê nascer e não chorar, deve-se fazê-lo chorar."

"O primeiro choro de um bebê é como o trovão da primavera. Ele dispersa as memórias remanescentes do núcleo espiritual, fazendo o cultivador esquecer seu passado e viver como um bebê normal. Esses dois cultivadores, no entanto, certamente perderam seus corpos originais. Mas no momento em que decidiram entrar no útero, já haviam selado seu destino. Não podem me culpar."

Dizendo isso, ele ficou em silêncio por um instante.

Desde que seu avô partira para o submundo, ele não percebera o quanto havia amadurecido. Agora era um verdadeiro mestre de talismãs.

Nesta situação, envolvendo dois poderosos cultivadores do Reino Núcleo Espiritual, ele — um simples mestre de talismãs do Reino Espírito Nascente — conseguiu dispersar suas habilidades e memórias de uma vida inteira, transformando-os em bebês!

Era exatamente como o avô dizia: a verdadeira essência de um mestre de talismãs está na sabedoria e na compaixão.

Chen Shi sorriu baixinho.

"Eu também posso me tornar um mestre de talismãs como o vovô."

O incidente do “bebê que falava no ventre” não era um caso de espírito maligno, mas ainda assim era o tipo de problema que um mestre de talismãs devia resolver — não apenas lutas contra demônios, mas também desordens espirituais e misteriosas como aquela.

O pequeno sacerdote que guardava a torre olhava curioso para ele. Chen Shi sorriu, e o jovem também retribuiu com um sorriso.

"Mestre taoísta, dizem que você é a guardiã de Luwei, mas por que é homem?" Chen Shi perguntou.

O pequeno sacerdote respondeu:

"Sou uma manifestação espiritual. Uma forma não tem gênero."

Chen Shi ficou surpreso.

"Eu sou formado pela fé e pelas preces do povo de Luwei. Sou um pensamento tornado forma, condensado pela devoção de muitos. Não tenho gênero."

Chen Shi não acreditou e se aproximou, tentando verificar.

O pequeno sacerdote o afastou com um tapa.

"Não seja insolente!"

Chen Shi riu.

"Mas se não tem aquilo... como faz xixi?"

"Eu sou uma forma divina. Não preciso disso."

"Ah, entendo."

Ainda assim, Chen Shi perguntou:

"Então por que sua forma é de um pequeno sacerdote?"

A pergunta deixou o espírito confuso.

Ele havia nascido assim — um reflexo das orações e imagens do povo — mas nunca pensara no motivo.

"E você, Chen Shi, por que tem essa aparência?"

O pequeno sacerdote devolveu a pergunta.

"Foi você quem escolheu seu rosto, ou foram outros que decidiram por você?"

Chen Shi ficou sem resposta, coçou a cabeça e se sentou ao lado dele, sorrindo.

"Meu rosto foi dado por meus pais. Não pude escolher. E o seu? Quem deu o seu?"

O pequeno sacerdote ficou boquiaberto, mergulhando em reflexão.

Chen Shi colocou o braço sobre seus ombros e riu:

"Então, pequeno sacerdote, eu acho que vocês, guardiões dos vilarejos, devem esconder muitos segredos!"

"Que segredos?" o pequeno sacerdote perguntou, confuso.

Chen Shi se levantou e começou a andar ao redor do grande sino.

"Acho que devemos começar com seu corpo original. Talvez o homem que as pessoas veneravam fosse realmente um pequeno sacerdote, e quando o povo canalizou fé e incenso, você assumiu a aparência dele... Tem certeza de que não tem aquilo? Deixa eu ver!"

Ele tentou puxar as calças do espírito e acabou levando uma surra. O pequeno sacerdote o espancou até ficar com o rosto inchado, e só então Chen Shi deitou para dormir, comportado.

Na manhã seguinte, um novo caso o procurou — não de espírito devorador, mas de possessão!

Aconteceu na vila Shinianzi. Um açougueiro, de aparência feroz mas bom de coração, vivia de matar porcos.

Naquele dia, por alguma razão, ele foi tomado por um espírito maligno. Durante o jantar, de repente surtou, amarrou a esposa e os filhos e os pendurou nas vigas — pronto para sangrá-los como se fossem porcos.

A família gritou por ajuda, e os vizinhos conseguiram salvá-los a tempo, mas o açougueiro ainda queria matar todos no vilarejo.

Chen Shi chegou, colou um talismã de exorcismo nele e expulsou o espírito. Depois encontrou o corpo de um porco morto, o queimou, e o caso foi encerrado.

Como o problema era simples, cobrou apenas duas taéis de prata.

O espírito era fraco. Tinha se formado porque o açougueiro não guardara o cadáver do porco a tempo, deixando-o exposto ao luar — e sob a luz do dia com lua, o porco morto se transformou em um espírito, possuindo o homem para se vingar.

"Quando há lua durante o dia, nenhum corpo — humano ou animal — deve ser exposto à luz. Deve ser enterrado ou guardado imediatamente."

Chen Shi instruiu os aldeões:

"Se alguém morrer, enterrem logo ou coloquem no caixão."

Mas ele sentia uma inquietação crescente.

Até agora, os espíritos eram fracos — mas logo, os mais fortes começariam a aparecer.

Antes que pudesse descansar, outro mensageiro chegou.

"Mestre Chen! Nossa vila também está sendo assombrada!"

Chen Shi correu ao local — mais um caso de ataque, alguém devorado por um rato cinzento demoníaco. Quando chegou, já era tarde.

Furioso, ele matou o rato.

Mais dois casos o aguardavam no mesmo dia. No primeiro, uma garotinha brincava à beira da estrada quando uma carroça passou, cheia de outras crianças. Elas a chamaram para subir.

A menina subiu e brincou com elas alegremente — mas, para os pais, ela parecia flutuar a um palmo do chão, rindo e gesticulando com o ar.

O espírito estava tentando levá-la para reencarnar. Chen Shi chegou a tempo e a salvou.

No segundo caso — outro ataque de rato cinzento.

"Essa tal de Vovó da Montanha Negra... quem é afinal?"

Chen Shi estava furioso. Metade dos espíritos vinham das montanhas de Qianyang; a outra metade, dos ratos ligados à Vovó da Montanha Negra. Uma afronta direta ao Senhor das Montanhas.

"De fato existe uma deidade chamada Vovó da Montanha Negra," explicou o pequeno sacerdote quando Chen Shi voltou à torre à noite.

"Ela é cultuada em um templo nas redondezas. O incenso lá é forte, e dizem que ela se manifesta com frequência. Muitos vilarejos vão adorá-la em festividades. Alguns dos meus próprios devotos também a visitam. E, de fato, há muitos ratos em seu templo..."

"Espere, está dizendo que Vovó da Montanha Negra não é um espírito maligno, mas uma deusa cultuada em um templo?" Chen Shi ficou intrigado.

"Acho que sim," o pequeno sacerdote respondeu, hesitante.

"Você é o mestre de talismãs. Não deveria saber disso melhor que eu?"

Chen Shi balançou a cabeça, ainda mais curioso.

Ser um deus cultuado e, ao mesmo tempo, agir como um espírito maligno... seria possível?

"Se até os ratos do templo dela são tão poderosos, essa Vovó da Montanha Negra deve ser alguém formidável."

Os olhos de Chen Shi brilharam.

"Parece que ela quer estabelecer um domínio nas montanhas Qianyang. Está enviando seus ratos para testar o terreno. Pequeno sacerdote, ela está vindo roubar seu território, seus devotos — e ainda permite que seus ratos devorem pessoas. Você não vai fazer nada?"

O pequeno sacerdote pensou um instante.

"Amanhã irei enfrentá-la!"

Na manhã seguinte, Chen Shi montou seu estande e começou a vender talismãs novamente. Desta vez, havia um novo tipo — o talismã do trovão.

Ele servia para eliminar espíritos fracos, era barato e justo, e podia ser pendurado em casa ou usado no corpo para garantir um mês de segurança. Se o talismã queimasse ou trovejasse, era sinal de que um espírito se aproximava e fora atingido.

Nessa hora, era preciso comprar outro.

Cada talismã custava cinquenta moedas — e vendeu tanto que Hei Guo ficou exausto, pálido por “perder tanto sangue” com o trabalho.

O lucro mal dava para comprar carne espiritual para alimentar o cachorro, mas os talismãs salvavam vidas — por isso, Chen Shi mantinha o preço baixo.

Ao meio-dia, o pequeno sacerdote apareceu de novo, com o rosto inchado e uma perna manca, sentado sob o sino.

"A Vovó da Montanha Negra é muito poderosa. Muito mais do que eu."

Ele falou em tom sombrio:

"Não consegui vencê-la. Ela disse que logo virá tomar conta de Luwei e que eu devo sair e virar um espírito errante."

Chen Shi ficou alarmado. Aquela velha realmente pretendia invadir as montanhas Qianyang!

Trabalhou até a noite. Quando o Festival da Lua terminou, ele pegou a estrada de volta para a Vila Huangpo.

O caminho pela montanha era íngreme. A carroça de madeira precisava percorrer mais de setenta li até o vilarejo. Chen Shi segurava a bússola para guiar o caminho, enquanto Hei Guo corria à frente, carregando o lampião na boca.

No meio da serra, o cachorro parou de repente. Chen Shi, em alerta, guardou a bússola e olhou para a escuridão à frente.

A luz da lua era fraca. Na estrada adiante, dezenas de olhos vermelhos brilhavam na escuridão — e mesmo sob o clarão do lampião, não se moviam.

"O senhor é o Mestre Chen Shi?"

Uma voz aguda soou.

"Por ordem da Vovó da Montanha Negra, trago uma mensagem: nós nunca nos intrometemos em seus assuntos, mas o senhor matou um dos netos queridos da Vovó. Agora ela quer sua vida. A vingança começa esta noite. Prepare o pescoço e aguarde!"

Chen Shi saltou da carroça.

"Quem está aí, fingindo ser deus?!"

Tomou o lampião de Hei Guo e o ergueu, iluminando o caminho. Diante dele, dezenas de figuras — altas como homens, com corpos humanos e cabeças de rato — o encaravam com olhos faiscantes.

O coração de Chen Shi gelou.

"Espíritos sob o comando da Vovó da Montanha Negra? São tantos assim? Será que mexi com um ninho inteiro de ratos?"

Ele ficou tenso. Se todos atacassem de uma vez, estaria acabado.

Esses ratos demoníacos não eram fortes individualmente, mas dominavam técnicas perigosas — um toque da ponta da cauda na cabeça bastava para adormecer qualquer um, tornando impossível se defender.

Chen Shi já havia experimentado isso. Sabia que, se fosse atingido, dormiria, e eles o devorariam até restar apenas ossos.

Mas, de repente, os ratos saltaram de volta para a escuridão e sumiram.

Chen Shi franziu o cenho.

Eles eram traiçoeiros. Um ataque surpresa seria difícil de evitar...

"Quando eu voltar, vou comprar um capacete de ferro pra dormir! Não... melhor ainda, preciso ir até o Túmulo do Verdadeiro Rei e conseguir o Manual Completo da Energia dos Três Sóis. Caso contrário, nunca vencerei a Vovó da Montanha Negra!"

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